O cardeal Peter Turkson, natural de Ghana, que atua no Vaticano desde 2009 (Foto: latimes.com)
Leiam este trecho de um de seus recentes posts, no qual se refere a uma época em que se abordava a possível sucessão do papa João Paulo II (1978-2005):
“Dizia-se, então, que, depois de João Paulo II, era chegada a hora de um ‘papa progressista’, de um papa latino-americano, de um papa africano — misturando-se, de resto, geografia com categoria teológica. Um papa africano não quer dizer, necessariamente, um papa “progressista” segundo os critérios mixurucas que se empregam por aí para definir o ‘progressismo’. O cardeal Peter Turkson, de Gana, por exemplo, é um crítico das violências cometidas na África por grupos islâmicos.”
De minha parte, a eleição de um papa “progressista” ou “conservador” não vem ao caso para o que pretendo abordar.
O que me parece, do ponto de vista de “mercado” da igreja, de seus interesses estratégicos a curto, médio e longo prazo, é que a escolha recaindo sobre um papa do Terceiro Mundo, em especial da África ou da América Latina, seria não apenas uma novidade extraordinária em si, um ato, se me permitem, de “marketing” de grande alcance.
Tratar-se-ia, no caso de um africano, como o cardeal Turkson — que opera desde 2009 no Vaticano e é presidente da Comissão Pontifícia da Justiça e Paz — ou um de seus colegas, de uma enorme, colossal contribuição da igreja no combate ao racismo e na valorização dos centenas de milhões de africanos e de seus descendentes espalhados pelo mundo.
Mas não apenas isso: um papa africano poderia ser uma forte barreira ao enorme crescimento do islamismo na África, especialmente de sua vertente tenebrosa — o islamismo radical –, e estenderia sua influência também a outras áreas onde a religião de Maomé se expande em velocidade vertiginosa, como a Ásia.
O cardeal-arcebispo de Tegucigalpa, em Honduras, Óscar Rodríguez Maradiaga (Foto: catholicherald.co.uk)
Um papa latino-americano (fala-se no cardeal-arcebispo de Tegucigalpa, capital de Honduras, dom Óscar Rodríguez Maradiaga, também presidente mundial da organização beneficente católica Caritas, mas não sou ninguém para sugerir nomes ou apostar em algum deles) representaria obviamente uma deferência à região do planeta que mais abriga católicos — 42% dos 1,1 bilhão que professam a fé no mundo, enquanto os da velha Europa são 25%.
Também ajudaria a revigorar o catolicismo nos Estados Unidos, onde os cidadãos de origem latino-americana, católicos em esmagadora maioria, já superam os 52 milhões em uma população de 315 milhões de habitantes.
E, naturalmente, e mais importante, poderia significar um freio ao rapidíssimo crescimento das igrejas protestantes evangélicas, sobretudo no Brasil, ou um começo de reversão desse processo.
Não se trataria, pois, de uma questão de “progressismo” ou “conservadorismo”, mas de estratégia.
Quem veja, eventualmente, tais considerações como ingênuas ou descabidas deve lembrar o papel que um papa pode representar até no mapa político.
Basta lembrar o caso mais recente, o do papa polonês João Paulo II, cuja assunção repercutiu de imediato no fortalecimento do sindicato católico Solidariedade na Polônia, abertamente apoiado pelo pontífice, e no progressivo desabamento do regime comunista no país, que João Paulo II visitou em viagens apoteóticas.
De crise em crise, a ditadura comunista precisou concordar com eleições parcialmente livres em junho de 1989, nas quais o Solidariedade concorreu como partido legítimo e obteve votação esmagadora.
O esfacelamento da ditadura comunista da Polônia foi o estopim de um inexorável processo de queda de peças no dominó da Cortina de Ferro. Em outubro, seria a vez da Hungria. O Muro de Berlim cairia em novembro, bem como os regimes comunistas da então Checoslováquia e da Bulgária, em dezembro o da Romênia — e assim foi. Em 1991, viria o fim da União Soviética.
Quem não consegue ver uma influência do falecido papa nesse processo precisa reestudar a história recente.
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